sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Conto de Mistério

Com a gola do paletó  levantada e a aba do chapéu abaixada, caminhando
pelos cantos escuros, era quase impossível a qualquer pessoa que cruzasse com ele
ver seu rosto. No local combinado, parou e fez o sinal que tinham já estipulado à guisa
de senha. Parou debaixo do poste, acendeu um cigarro e soltou a  fumaça em  três
baforadas compassadas. Imediatamente um sujeito mal-encarado, que se encontrava
no café em frente, ajeitou a gravata e cuspiu de banda.
Era  aquele. Atravessou  cautelosamente  a  rua,  entrou  no  café  e  pediu  um
guaraná. O outro sorriu e se aproximou: “Siga-me!” - foi a ordem dada com voz cava.
Deu  apenas  um gole  no guaraná  e  saiu. O  outro  entrou  num beco  úmido  e maliluminado e ele - a uma distância de uns dez a doze passos - entrou também.
Ali parecia não haver ninguém. O silêncio era sepulcral. Mas o homem que ia
na frente olhou em volta, certificou-se de que não havia ninguém de tocaia e bateu
numa janela. Logo uma dobradiça gemeu e a porta abriu-se discretamente.
Entraram os dois e deram numa sala pequena e enfumaçada onde, no centro,
via-se  uma mesa  cheia  de  pequenos  pacotes.  Por  trás  dela  um  sujeito  de  barba
crescida, roupas humildes e ar de agricultor parecia  ter medo do que  ia  fazer. Não
hesitou - porém - quando o homem que entrara na frente apontou para o que entrara
em seguida e disse: "É este".
O que estava por  trás da mesa pegou um dos pacotes e entregou ao que
falara. Este passou o pacote para o outro e perguntou se trouxera o dinheiro. Um aceno
de cabeça foi a resposta. Enfiou a mão no bolso, tirou um bolo de notas e entregou ao
parceiro. Depois virou-se para sair. O que entrara com ele disse que ficaria ali.
Saiu então sozinho, caminhando rente às paredes do beco. Quando alcançou
uma rua mais clara, assoviou para um táxi que passava e mandou tocar a toda pressa
para determinado endereço. O motorista obedeceu e, meia hora depois, entrava em
casa a berrar para a mulher:
- Julieta! Ó Julieta... consegui.
       A mulher veio  lá de dentro enxugando as mãos em um avental, a sorrir de
felicidade. O marido colocou o pacote sobre a mesa, num ar triunfal. Ela abriu o pacote
e verificou que o marido conseguira mesmo. Ali estava: um quilo de feijão.

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